A minha Lista de blogues

quarta-feira, 31 de março de 2010

MÚSICAS

Ouço:

To Repel Ghosts
http://www.youtube.com/watch?v=2hpxmdTT65M&feature=player_embedded#

Editors - Papillon – Live In Session
http://www.youtube.com/watch#!v=fQ3TyLYj2hk&feature=related

Editors - Papillon
http://www.youtube.com/watch#!v=Wq4tyDRhU_4&feature=related

Isadora Duncan

“Uma vez você já foi selvagem. Não deixe que a amansem.”

(Isadora Duncan, bailarina entre todas as bailarinas e exemplo para a vida)

terça-feira, 30 de março de 2010

BURACO BRANCO

“ A vida é um buraco. Uma origem. Um túnel de entrada para a saída. Um troço para qualquer caminhada. Haverá sempre uma ficha para haver luz. Haverá sempre uma tampa para haver tinta. Haverá sempre um bolo para furar. Haverá sempre um buraco para abrir e para tapar. Para tapar, para abrir.

A vida é um buraco onde nos encontramos deitados na terra. A terra que serve, que servir. A terra que pesa, que não pesar. A terra que a nossa caminhada juntar para nos tapar.”

A vida é um buraco para cavar.

Buraco Branco
de Luís Carvalho

PASSADO, PRESENTE E FUTURO

Passado, Presente e Futuro


"Começou a caminhada e logo um dilema.
Diante dele três caminhos, e em cada um deles, estava uma pessoa, das quais a primeira se identificou:
- Eu sou o velhote do Passado. Sou velho, muito velho. Vivo de recordações e factos passados.
- Consulto diariamente o meu álbum de fotografias. Revejo todos os episódios passados e fico sobretudo triste porque estou sempre a encontrar a mágoa, o ressentimento e o sentimento de culpa. Estão sempre presentes. Sempre a magoar-me e a acusar-me.
-Também tenho episódios bons e momentos felizes, mas esses diluem-se nos outros. O que está sempre presente, para quem caminha no meu caminho, são sobretudo os momentos menos bons: os fantasmas do Passado. Que aparecem e desaparecem, deixando sempre a sua marca.
- É um caminho com pouca luz. Há sobretudo escuridão. Há pessoas que vivem só no meu caminho, mas também tenho muitos atalhos com o caminho do Presente. A maioria dos meus caminhantes são pessoas que não se sentem bem no caminho do Presente e estão quase sempre a caminhar no meu caminho. São as pessoas que gostam de visitar os meus Fantasmas.
O Poeta ficou estupefacto e exclamou:
- Que caminho tão escuro! Certamente que não será este o caminho da Felicidade! O caminho da Felicidade será certamente um caminho iluminado. Um caminho onde a luz estará sempre presente.
E partiu, ao encontro da segunda pessoa: um jovem e alegre personagem.
- Eu sou o caminho do Presente – identificou-se!
- O meu caminho é o ponto de partida para o caminho da Felicidade. È o aqui e agora. O início. Não tenho atalhos para o caminho do Passado, porque sei que tudo o que aconteceu no passado é passado.
- Acontece que o passado já passou e, conseqüentemente, deixou de fazer parte do momento presente, a própria realidade. Portanto, não faz parte do meu caminho. Caminhamos mesmo em direcções diferentes. E acontece que não tenho atalhos com o caminho do Passado, porque o passo que dei ontem já é passado, no momento de hoje. E, além disso, não gosto de criar e fazer viver os fantasmas do passado. Nem gosto de fantasmas!
- E nunca olhas para trás? - perguntou o Poeta .
- Esse é um dos problemas. Tenho que estar sempre a avisar os meus caminhantes. Quando olham para trás e observam esse momento, devem entender isso somente como lições: lição nº 1, lição nº 2, lição nº 3 e por aí adiante. São apenas tabuletas de aviso aos caminhantes, quando estes olham para trás. É fundamental também ser um bom estudante.
- E nunca ficas arrependido de ter caminhado daquela maneira? - perguntou novamente o Poeta.
- Não. Entendo apenas os meus passos de ontem como mais um elemento de aprendizagem e aperfeiçoamento, para o passos que estou a dar aqui e agora, no momento presente.
Eu também concordo contigo, caminho do Presente – disse o Poeta. Não quero atalhos para o caminho do Passado, porque não quero ver os fantasmas do passado. Quero elimina-los da minha mente. Estão sempre a perturbar a serenidade das pessoas e a impedi-las de caminharem tranqüilamente no Caminho da Felicidade. Eles não devem existir. Eles não existem!
O Poeta caminhou então em direcção ao caminho do Futuro, que se identificou logo:
- Eu sou o caminho do Futuro! De facto, não existo: sou ilusão. O caminho do Futuro, na realidade, não existe. Estou envolto num nevoeiro muito denso. Pensam que existo, mas não existo. Estou apenas na imaginação das pessoas.
- E olha que há pessoas verdadeiramente obcecadas por mim. Já nem vivem no momento presente. Preferem só caminhar no meu caminho, ignorando completamente o caminho do Presente. Estão sempre nos atalhos!
- Por outro lado, tenho dois ajudantes, que estão sempre a tentar cativar as pessoas para caminharem no meu caminho: são o medo e a insegurança. São óptimos a angariarem caminhantes. E são terríveis, porque ao fazerem isso, levam a que os caminhantes deixem de caminhar. A ilusão de pensarem que estão a caminhar no meu caminho, e que, de facto, não estão, impede-os de caminharem no momento presente, perdendo assim inúmeras oportunidades que a vida lhes reserva.
- É, concordo contigo, caminho do Futuro – disse o Poeta. E a vida oferece-nos tão poucos presentes especiais, as tais oportunidades. E a maioria das vezes, essas oportunidades perdem-se! E os principais culpados são esses seus dois ajudantes: o medo e a insegurança! Qual deles o pior?
- Mas é bom olhar para o futuro, não? – perguntou o Poeta.
- É bom olhar, como meta, como objectivo e até como Sonho. Mas os caminhantes não devem é deixar de caminhar no momento presente, devido á tal obsessão do futuro, por medo ou insegurança, deste modo desperdiçando as escassas oportunidades que a vida se lhes oferece. O futuro é o momento presente do amanhã. Porque não vivê-lo só amanhã?
- E depois há outro aspecto, caminho do Futuro, que é a ansiedade – afirmou o Poeta. A ansiedade, que deve ser das companhias mais indesejáveis, vai sempre aumentando na mochila dos caminhantes à medida que caminhamos demasiado no Futuro, porque ele próprio é uma indefinição. Não existe. E tudo o que não existe arrasta sempre consigo uma insegurança e medo. E, aos poucos, a mochila da ansiedade vai pesando cada vez mais, no coração dos caminhantes.
- Portanto, o segredo é olhar somente, e não caminhar no Futuro, não é?
- É, Poeta, vejo que estás no bom caminho!
O Poeta, sentiu-se contente de ouvir aquilo. E partiu para o local onde estava o momento presente, para iniciar a grande caminhada, em direcção ao cume da Felicidade, o tal grande objectivo da vida.
- Os meus passos vão ser o aqui e agora, direito, esquerdo, no momento presente. Sem, todavia, deixar de olhar para o passado, como lição, como factor de aprendizagem, e olhar para o futuro, como luz, como orientação apenas. Quanto aos fantasmas do passado, como as mágoas, ressentimentos e sentimento de culpa, e à ansiedade do medo e insegurança do futuro vou deixa-los aqui, à entrada do caminho. Aqui mesmo! Aqui e agora!
- Uf, sinto-me muito mais leve e tranqüilo para viver o momento presente. Que bom! Direito, esquerdo, aqui e agora! Direito, esquerdo, aqui e agora!
E partiu........."

António Ramalho
via
http://www.antonioramalho.com/homepage.asp

http://www.antonioramalho.com/pagina.asp?ID=74

JOSÉ CARLOS ARY DOS SANTOS

Kyrie


Em nome dos que choram,
Dos que sofrem,
Dos que acendem na noite o facho da revolta
E que de noite morrem,
Com esperança nos olhos e arames em volta.
Em nome dos que sonham com palavras
De amor e paz que nunca foram ditas,
Em nome dos que rezam em silêncio
E falam em silêncio
E estendem em silêncio as duas mãos aflitas.
Em nome dos que pedem em segredo
A esmola que os humilha e os destrói
E devoram as lágrimas e o medo
Quando a fome lhes dói.
Em nome dos que dormem ao relento
Numa cama de chuva com lençóis de vento
O sono da miséria, terrível e profundo.
Em nome dos teus filhos que esqueceste,
Filho de Deus que nunca mais nasceste,
Volta outra vez ao mundo!

(José Carlos Ary dos Santos)





A poesia, de Ary dos Santos, lida por ele mesmo

http://www.youtube.com/watch#!v=fbsOhWt3nyw&feature=related

Balada para uma velhinha

http://www.youtube.com/watch#!v=Dk2zJeabJSU&feature=related


Poeta castrado, Nao! - José Carlos Ary dos Santos

http://www.youtube.com/watch?v=ZmqR-7t43I0&feature=player_embedded

segunda-feira, 29 de março de 2010

PSICANÁLISE DA ESCRITA

Mesmo que fale de sol e de montanhas,
mesmo que cante os ínfimos espaços
ou as grandes verdades,
todo o poema
é sobre aquele
que sobre ele escreve

Quando os traços de si
parecem excluir-se das palavras,
mesmo assim é a si que se descreve
ao escrever-se no texto
que é excisão de si

Todo o poema
é um estado de paixão
cortejando o reflexo
daquele que o criou

Todo o poema
é sobre aquele
que sobre ele escreve
e assim se ama da forma desmedida,
à medida do verso onde a si se contempla
e em vertigem
se afoga


Ana Luísa Amaral

Inéditos
in
“Inversos”
....poesia
1990-2010
Ed. D.Quixote

sexta-feira, 26 de março de 2010

MEMBRANAS

MEMBRANAS

metamorfoses inconstantes evoluem nas (r)evoluções
das maçãs. pobre Newton! no caminho do ínfimo, a
mecânica produziu incerteza. nenhuma esfera de vidro
resistiu! só há inércia nos estilhaços de rubis translúcidos.

o retorno apenas é possível pela alquimia dos sentidos,
pela busca do elo dos multi-Versos interiores. quais
cascatas verdes? sustenta-te nas terras das águas azuis.
não te esqueças que as estrelas são corpetes de jóias lilases.

animal político? por isso não existe lei sem paixão! já
tentaste Estagira? fazes bem! de qualquer maneira não
é inteiramente redutor. pensa na alternativa, a Cidade
do Sol, e reparte-te no espírito da entidade cósmica.

qual a velocidade para se viajar entre galáxias? simples.
terá que ser geometricamente proporcional à distancia a
percorrer. no entanto, nada se afasta. é o espaço que se
expande! e aí chegarás ao pensamento do coração branco.

vês agora porque sigo golfinhos às quintas e as nebulosas
laranjas pela manhã? são a chave para a vibração pulsante
nos perfumes dos oceanos astrais. ou física em poeiras! no
acelerador de probabilidades internas dum orbe carecido.

que hei-de fazer? gosto de gatos siameses! principalmente,
em buracos de par nove. são mais resistentes. e meigos.

mas nunca abandonarei o imaginário vivo dos teus verbos.

[ Vicente Ferreira da Silva ,in "Interlúdios da Certeza"]

quinta-feira, 25 de março de 2010

MÁRIO VIEGAS

Mário Viegas - "Os ais" (1948- 1996)
http://www.youtube.com/watch?v=YzN9uqb97bA


Operário em construção
http://www.youtube.com/watch#!v=AmYc5fCbUPE&feature=related

Leonardo da Vinci

O tempo dura quanto baste para quem quer utilizá-lo.
Leonardo da Vinci (1452-1519)

quarta-feira, 24 de março de 2010

Manuel António Pina

A poesia vai acabar


A poesia vai acabar, os poetas
vão ser colocados em lugares mais úteis.
Por exemplo, observadores de pássaros
(enquanto os pássaros não
acabarem). Esta certeza tive-a hoje ao
entrar numa repartição pública.
Um senhor míope atendia devagar
ao balcão; eu perguntei: «Que fez algum
poeta por este senhor?» E a pergunta
afligiu-me tanto por dentro e por
fora da cabeça que tive que voltar a ler
toda a poesia desde o princípio do mundo.
Uma pergunta numa cabeça.
— Como uma coroa de espinhos:
estão todos a ver onde o autor quer chegar? —

terça-feira, 23 de março de 2010

Goethe

Todos os dias devíamos ouvir um pouco de música, ler uma boa poesia, ver um quadro bonito e, se possível, dizer algumas palavras sensatas.
Goethe

segunda-feira, 22 de março de 2010

Sophia

Caminho para o mar

Sinto que hoje novamente embarco
Para as grandes aventuras,
Passam no ar palavras obscuras
E o meu desejo canta - por isso marco
Nos meus sentidos a imagem desta hora.

Sonoro e profundo
Aquele mundo
Que eu sonhara e perdera
Espera
O peso dos meus gestos.

E dormem mil gestos nos meus dedos.

Desligadas dos círculos funestos
Das mentiras alheias,
Finalmente solitárias,
As minhas mãos estão cheias
De expectativa e de segredos
Como os negros arvoredos
Que baloiçam na noite murmurando.

Ao longe por mim oiço chamando
A voz das coisas que eu sei amar.

E de novo caminho para o mar.

Sophia Mello Breyner Andresen

domingo, 21 de março de 2010

Almada Negreiros

Mãe!

Mãe! dói-me o peito. Bati com o peito contra a estátua que tem em cima o
verbo ganhar. Ainda não sei como foi. Eu ia tão contente! eu ia a pensar em ti e
no verbo ganhar. Estava tudo a ser tão fácil! Já estava a imaginar a tua alegria
quando eu voltasse a casa com o verbo saber e o verbo ganhar, um em cada
mão!
Dói-me muito o peito, Mãe! passa a tua mão pela minha cabeça!
Almada Negreiros, A Invenção do Dia Claro

Carlos Drummond de Andrade

RETRATO DE FAMÍLIA


Este retrato de família
Está um tanto empoeirado.
Já não se vê no rosto do pai
Quanto dinheiro ele ganhou.

Nas mãos dos tios não se percebem
As viagens que ambos fizeram.
A avó ficou lisa, amarela,
Sem memórias da monarquia.

Os meninos, como estão mudados.
O rosto de Pedro é tranquilo,
Usou os melhores sonhos.
E João não é mais mentiroso.

O jardim tornou-se fantástico.
As flores são placas cinzentas.
E a areia, sob pés extintos,
É um oceano de névoa.

No semicírculo das cadeiras
Nota-se um certo movimento.
As crianças trocam de lugar,
Mas sem barulho: é um retrato.

Vinte anos é um grande tempo.
Modela qualquer imagem.
Se uma figura vai murchando,
Outra, sorrindo, se propõe.

Esses estranhos assentados,
Meus parentes? Não acredito.
São visitas se divertindo
Numa sala que se abre pouco.

Ficaram traços de família
Perdidos no jeito dos corpos.
Bastante para sugerir
Que um corpo é cheio se surpresas.

A moldura deste retrato
Em vão prende seus personagens.
Estão ali voluntariamente,
Saberiam – se preciso – voar.

Poderiam subtilizar-se
No claro-escuro do salão,
Ir morar no fundo dos móveis
Ou no bolso de velhos coletes.

A casa tem muitas gavetas
E papéis, escadas compridas.
Quem sabe a malícia das coisas,
Quando a matéria se aborrece?

O retrato não me responde,
Ele me fita e se contempla
Nos meus olhos empoeirados.
E no cristal se multiplicam

Os parentes mortos e vivos.
Já não distingo os que se foram
Dos que restaram. Percebo apenas
A estranha ideia de família

viajando através da carne.

Carlos Drummond de Andrade, A Rosa do Povo, 1945

sábado, 20 de março de 2010

Cecília Meireles

CANÇÃO MÍNIMA

No mistério do Sem-Fim,
equilibra-se um planeta.
E, no planeta, um jardim,
e, no jardim, um canteiro;
no canteiro, uma violeta,
e, sobre ela, o dia inteiro,
entre o planeta e o Sem-Fim,
a asa de uma borboleta.

Cecília Meireles

sexta-feira, 19 de março de 2010

Maria do Rosario Pedreira

Quando eu morrer,
não digas a ninguém que foi por ti.
Cobre o meu corpo frio com um desses lençóis
que alagámos de beijos
quando eram outras horas nos relógios do mundo
e não havia ainda quem soubesse de nós;

e leva-o depois para junto do mar,
onde possa ser apenas mais um poema –
como esses que eu escrevia
assim que a madrugada se encostava aos vidros
e eu tinha medo de me deitar só com a tua sombra.

Deixaque nos meus braços pousem então as aves
(que , como eu, trazem entre as penas
a saudade de um verão carregado de paixões).
E planta à minha volta uma fiada de rosas
brancas
que chamem pelas abelhas,
e um cordão de árvores que perfurem a noite –
porque a morte deve ser clara
como o sal na baínha das ondas,
e a cegueira sempre me assustou
( e eu já ceguei de amor, mas não contes a ninguém que foi por ti).


Quando eu morrer,
deixa-me a ver o mar do alto de um rochedo e não chores,
nem toques com os teus lábios a minha boca fria.
E promete-me que rasgas os meus versos em pedaços tão pequenoscomo pequenos foram sempre os meus ódios;
e que depois os lanças na solidão de um arquipélago
e partes sem olhar para trás nenhuma vez:
se alguém os vir de longe brilhando na poeira,
cuidará que são flores que o vento despiu,
estrelas que se escaparam das trevas,
pingos de luz, lágrimas de sol,
ou penas de um anjo que perdeu as asas por amor.

Maria do Rosario Pedreira
O Canto do Vento nos Ciprestes

quinta-feira, 18 de março de 2010

Salvador Dalí

Walt Disney animation by Salvador Dalí

http://www.youtube.com/watch?v=1-8mSpwjyxU&feature=player_embedded

A noite

A noite é essa escuridão tão envolvente
que parece um exercício de morte:
assim vai desaparecendo tudo,
assim desaparecemos dos outros
e de nós.

Apenas respiramos.
Podem cortar esse ultimo fio
- e o tear que somos se imobiliza.

A noite esconde a terra, o céu, a casa,
os vossos rostos.

Estou novamente dentro de uma entranha?
Humana? Cósmica? Em que entranha me aninho,
onde se enrola o novelo da minha memória,
em que cofre, na escuridão?

Nossas asas estão docemente fechadas
e nossos olhos moram no pensamento.

Cada um tem a sua noite.
Cada coisa.
E tudo está na sua noite,
enquanto é noite.

O dia é um bailarino com sinos e espelhos.

Interrompemos a treva onde aprendíamos lembranças;
e somos de repente uns falsos acordados.

(Cecília Meireles)

quarta-feira, 17 de março de 2010

Uma rosa e Milton

Uma rosa e Milton

De tantas gerações de inúmeras rosas
Que se perderam no fundo do tempo
Quero roubar só uma ao esquecimento,
Uma sem marca ou sinal entre as coisas
Que existiram. Oferece-me o destino
O dom de nomear pla vez primeira
Essa flor silenciosa, a derradeira
Rosa que Milton do rosto aproxima
Sem ver. Ó amarela ou tu, vermelha,
Branca rosa de um jardim apagado,
Deixa magicamente o teu passado
Imemorial, e neste verso brilha,
oiro, sangue ou marfim ou tenebrosa
Como nas suas mãos, oculta rosa.

Jorge Luís Borges
in O OUTRO, O MESMO
(1964)

Frederico Garcia Lorca

Ode a Salvador Dali de Frederico Garcia Lorca


http://www.youtube.com/watch?v=PArHBPiiNC4

terça-feira, 16 de março de 2010

Prós e Contras

Programa Prós e Contras de 15 de Março


NOVOS HORIZONTES
Portugal no século XXI. Medo do futuro ou vontade de vencer? O que vale o Rigor e a Ética? Política e Economia

http://ww1.rtp.pt/icmblogs/rtp/pros-contras/

BOCAGE

«Mas o que enfim se não entende
É que aquele que se prende
É quem nos prende a nós»

Gustavo Matos Sequeira in Bocage

segunda-feira, 15 de março de 2010

JOSÉ LUIS PEIXOTO

Desistir
Uma única vida é pouco. O rosto é demasiado rápido a mudar nas fotografias. As crianças imaginam tantas coisas acerca do mundo e, mais tarde, percebem que não conseguiram imaginar aquilo que era mais importante. Ainda crianças e já quase adultos, ainda levados por miragens e, no entanto, com a certeza absoluta de que não acreditam em nada, surpreendem-se com os braços que cresceram no espelho, com os truques que são capazes de fazer de olhos fechados, com os cigarros que começam a arder-lhes na ponta dos dedos e, arrogantes ingénuos, desejam que o tempo passe mais depressa, desejam que os anos passem mais depressa. Depois, a idade não conta. A idade não conta, mas um dia têm trinta anos, têm quarenta anos, um dia têm cinquenta anos. Os números deixam de ser números. Então, esqueceram tantas coisas e, no entanto, têm a certeza absoluta de que sabem tudo. Ridículos. Entretanto, apaixonaram-se e desapaixonaram-se; saltaram por cima de momentos que foram como abismos; existiu a casa; existiram todos os objectos da casa, divididos e arrumados em caixas de papelão; existiu a mágoa como se fosse o mundo inteiro, não era; existiram as pessoas que morreram mesmo ao lado, que pareciam eternas e que, devagar ou num instante, foram esquecidas, fácil; existiram as pessoas que estavam mesmo ao lado e que receberam telefonemas para comunicar-lhes que a mãe tinha morrido num hospital; e repetiram a vida continua, a vida continua; e o verão e o verão e o outono, a primavera, tão bom, e o verão, o outono, e o inverno e o inverno. Um dia, acordam e o passado não é suficiente sequer para lhes encher a palma de uma mão.
E convencem-se de uma mentira diferente todas as manhãs para obrigarem o corpo a fazer cada movimento e, apesar disso, acreditam nessa mentira exactamente como se fosse verdade, excepto às vezes. E estão cansados da mulher que, cansada, os olha ao serão e que, apesar disso, os enternece quando se debruça sobre o lavatório da casa de banho, com toalhas pelos ombros, para pintar o cabelo. Pode então haver um momento em que o mundo pára. A idade pára. É nesse instante que se pode pensar: nunca quis ser aquilo em que me tornei, quis sempre não ser aquilo em que me tornei. Com o mundo completamente parado, com a idade parada, não é difícil parar também e, rodeados de fragmentos: uma existência inteira feita de vidro estilhaçado e espalhado no chão: o mais natural é baixarmo-nos sobre os calcanhares, pousar os cotovelos sobre os joelhos dobrados e, com cuidado, esticar as mãos para, com a ponta dos dedos, se começar a escolher cada fragmento, distinguir o que se deve abandonar do que se deve manter. Desistir não é sempre mau. Há vezes em que não se pode evitar. Todos nos dizem continua, continua, mas é o mundo que desiste, inteiro, à nossa volta.
Uma única vida é pouco. Para se fazer aquilo que se sabe e se pode e se quer e se deve fazer é preciso deixar muitas outras coisas para trás. Essa é a conclusão a que se chega logo no fim da adolescência. Quando os números deixam de ser números. Trinta, quarenta, cinquenta anos. As gerações sucedem-se. Os degraus de uma escada rolante que desaparecem lá em cima enquanto subimos, subimos, olhamos para trás e ainda vemos o primeiro degrau, quase como quando tínhamos acabado de chegar e, no entanto, continuamos a subir e vemos já o fim. Os nossos avós mortos, os nossos pais mortos, nós, os nossos filhos, os nossos netos. E, se existir um horizonte, podemos olhá-lo e perceber finalmente que estamos parados no tempo e que o tempo, nesse presente definitivo, está parado dentro de nós.
Eu olho para esse horizonte, arrependo-me e não me arrependo, tento compreender ou lembrar-me daquilo que quero mesmo. Depois, penso em tudo aquilo que posso fazer para que aconteça: os gestos e as palavras. Depois, hoje é um dia mais forte e, de repente, imenso. Depois, penso em tudo aquilo de que terei de desistir para alcançar o que quero: para ser o que desejo ser. Então, não fico triste. Aceito tudo aquilo que nunca fiz e que acredito que nunca terei vida suficiente para fazer. Num dia, avisado ou sem aviso, morrerei. Estas mãos serão nada. Este rosto será nada. Uma única vida é pouco. Aceito essa certeza sem que ninguém me pergunte se estou disposto a aceitá-la. É então que me convenço finalmente que nunca serei campeão de xadrez, nunca registarei uma patente, nunca conduzirei uma Harley Davidson, nunca invadirei um pequeno país, nunca venderei relógios roubados aos transeuntes da rua Augusta, nunca serei protagonista de um filme de Hollywood, nunca escalarei o monte Evarest, nunca farei uma colcha de renda, nunca apresentarei um concurso de televisão, nunca farei uma neurocirurgia, nunca ganharei a lotaria, nunca casarei com uma princesa, nunca ficarei viúvo de uma princesa, nunca me mudarei para Detroit, nunca farei voto de silêncio, nunca tocarei harpa, nunca serei o empregado do mês, nunca descobrirei a cura para o cancro, nunca beijarei os meus próprios lábios, nunca construirei uma catedral, nunca velejarei sozinho à volta do mundo, nunca decorarei uma enciclopédia, nunca despoletarei uma avalanche, nunca apresentarei cálculos que contradigam Einstein, nunca ganharei um óscar, nunca atravessarei o Canal da Mancha a nado, nunca participarei nos jogos olímpicos, nunca esfaquearei alguém, nunca irei à lua, nunca guardarei um rebanho de ovelhas nos Alpes, nunca conhecerei os meus tetranetos, nunca repararei a avaria de um avião, nunca trocarei de pele, nunca bombardearei uma cidade, nunca serei fluente em finlandês, nunca comporei uma sinfonia, nunca viverei numa ilha deserta, nunca compreenderei Hitler, nunca exibirei um quadro no Louvre, nunca assaltarei um banco, nunca darei um salto mortal no trapézio, nunca atravessarei a Europa de bicicleta, nunca lapidarei um diamante, nunca farei patinagem artística, nunca salvarei o mundo. Ainda assim, além de tudo isto, há o universo inteiro.
Retirado daqui:

http://bravonline.abril.ig.com.br/blog/joseluispeixoto/

domingo, 14 de março de 2010

Lewis Carroll

If I had a world of my own, everything would be nonsense. Nothing would be what it is, because everything would be what it isn't. And contrary wise, what is, it wouldn't be. And what it wouldn't be, it would. You see?

Alice in Wonderland (1865), Lewis Carroll

Tudo me leva

Tudo me leva a crer que as marcações que nos deram para o desempenho da vida, passam ao lado do caminho por onde os nossos afectos poderiam fluir, conforme o que está escrito no mapa oculto do ser humano. Pressinto que continuamos fora do essencial e que as razões das circunstâncias - que, muitas vezes, são poderosas e reais - só servem para nos afastar dos enigmas que estão à frente das coisas e que nos caberia decifrar. Porque, algumas vezes até parece que a simplicidade emana do andamento da vida e que nos bastaria um pequeno gesto de espírito para passarmos para o lado de lá de tantas incomodidades que nos fazem viver como se tivéssemos calçado dois números abaixo da forma da alma.

António Alçada Baptista
in "O Riso de Deus"

sexta-feira, 12 de março de 2010

ALICE

Ora, disse a Morsa ao Carpinteiro,

vamos ter muito que falar:

de botas, e lacre, e veleiros,

de reis, e couves da casa,

de saber porque ferve o mar,

ou se há porcos com asas.

- Quando uso uma palavra – disse Humpty Dumpty em tom escarninho – ela significa exatamente aquilo que eu quero que signifique... nem mais nem menos.
- A questão – ponderou Alice – é saber se o senhor pode fazer as palavras dizerem coisas diferentes.
- A questão – replicou Humpty Dumpty – é saber quem manda.


(Lewis Carroll. «Alice do outro lado do espelho», cap. IV)

quinta-feira, 11 de março de 2010

Carta

1. se v. exa. me permite
eu gostaria de dizer o que penso.

2. em primeiro lugar penso
que v. exa. anda
no sentido oposto ao dos ponteiros do relógio.

3. v. exa. dirá que eu estou afirmando
que v. exa. anda para trás.

4. na verdade, nada me impede de afirmar que
v. exa. anda para trás.
não foi isso porém que eu disse.

5. com efeito, não sei
se v. exa. anda para trás, segundo penso,
v. exa. anda no sentido oposto ao dos ponteiros
do relógio.

6. seria necessário poder afirmar com toda
a segurança que os ponteiros do relógio
andam para a frente, para poder afirmar
com igual segurança
que v. exa. anda para trás.

7. mas quem está em condições de
afirmar com toda a segurança
que os ponteiros do relógio andam
para a frente? ninguém está
em condições de afirmar com toda a segurança
que os ponteiros do relógio andam
para a frente, porque, como v. exa. sabe,
os ponteiros do relógio andam à roda.

8. a única coisa que se pode afirmar com toda a
segurança
é que os ponteiros do relógio andam
à roda para um lado e v. exa.
anda à roda para o outro. os ponteiros
do relógio rodam para um lado e v. exa. roda
para outro. de modo que v. exa. com
o seu movimento anula o movimento
dos ponteiros do relógio e vice-versa.

9. na verdade é como
se v. exa. não andasse e como
se os ponteiros também não andassem.


10 com efeito, não creio que v. exa.
(ande para a frente
nem que v. exa. ande para trás,
(não creio que v. exa.
ande para cima nem que v. exa ande para baixo,
(não creio que v. exa.
ande para a direita nem que v. exa.
(ande para a esquerda,
apenas suponho que v. exa. ande à roda
(de si mesmo,
no sentido oposto ao dos ponteiros do relógio e,
ainda,
de olhos fechados, para não enjoar.

11. o que eu, em duas palavras,
(em segundo lugar penso,
é que v. exa. usa um instrumento de osso
(ou de plástico
com uma enfiada de pontas aceradas
(chamado pente,
a fim de estar sempre bem penteado, pois nada
perturba mais v. exa. que o receio de não
estar bem penteado, nada perturba mais
v. exa., e é por isso que só quando v. exa.
acaba por perder o cabelo todo se começa
a sentir um pouco à vontade.
(é, segundo suponho,
por isso.

12. de forma que a visão de
v. exa. e dos restantes concidadãos
andam todos à roda de si mesmos,
no sentido oposto ao dos ponteiros do relógio,
de olhos fechados e cabelo cuida-
(dosamente penteados
é um espectáculo alucinante,
que v. exa. infelizmente não pode apreciar,
por ter os olhos vendados.

13. claro que v. exa. julga que só v. exa.
faz o movimento que v. exa. faz, e o mesmo
julgam os restantes concidadãos, pois
todos se consideram uma excepção, um
caso único, especial, e no entanto todos
formam uma regra, no seu movimento regular,
no seu círculo vicioso,
à roda de si mesmos,
no sentido oposto ao dos ponteiros do relógio,
de olhos fechados
e cabelos cuidadosamente penteados.




Alberto Pimenta

quarta-feira, 10 de março de 2010

Valentina Igoshina

Valentina Igoshina - playing "Liebestraum" -- Liszt

http://www.youtube.com/watch#!v=rf-HzJ4rbEo&feature=related

Valentina Igoshina - Rachmaninov Piano concerto n° 2 (I Moderato 1/2)

http://www.youtube.com/watch?v=jFbwpfxTs0k&feature=player_embedded


http://valentina-igoshina.com/

DANIEL SAMPAIO

O médico e psiquiatra Daniel Sampaio esteve, no passado dia 19 de Janeiro, na Biblioteca Municipal Camilo Castelo Branco para apresentar a sua última obra científica, desenvolvida em conjunto com a psicóloga e professora na Faculdade de Motricidade Humana em Lisboa, Margarida Gaspar de Matos. Jovens com Saúde – Diálogo com uma Geração é um livro escrito a quatro mãos, um olhar sobre o mundo actual, que combina duas formas diversas de olhar a mesma temática: a psiquiatria e a psicologia.

Questionado em relação ao público-alvo a quem é dirigida a obra, o clínico afirma destinar-se sobretudo aos jovens, mas não só. Aos pais e professores também. Sobretudo a estes últimos, uma vez que é da opinião de que: «Uma escola não é só para aprender conteúdos; é para formar cidadãos».

A variedade dos temas bordados parece quase inesgotável, abarcando a saúde das crianças e dos adolescentes, a incluir as questões relacionadas como a obesidade e a bulimia/anorexia – cuja solução poderá passar pela educação alimentar nas escolas, combinada com a prática regular de exercício físico – às relações interpessoais (com os pais, colegas, professores, auxiliares...), o ego, os comportamentos auto-destrutivos, a violência, o bullying, a toxicodependência, o alcoolismo, a imigração, a internet, com especial destaque à educação sexual nas escolas. O Autor mostrou algum pesar pelo facto de algumas pessoas que distribuíam panfletos a defender a eliminação total daquela disciplina nas escolas não estarem presentes na audiência para exporem o seu ponto de vista e debaterem a questão.

Daniel Sampaio salientou a utilidade do livro, no sentido de ajudar a promover o diálogo inter-geracional e à promoção de factores de resiliência, isto é, da capacidade de resistir a circunstâncias adversas. Deu, sobretudo, ênfase ao papel da família como agente educativo fundamental, na construção da auto-estima um factor bastante vulnerável às mensagens negativas, vindas daqueles com quem os jovens contactam diariamente. Mostrou, também, a importância do papel das actividades artísticas na vida de um jovem, como facilitadoras da integração social, assim como o papel do sono, fundamental para o equilíbrio emocional, a concentração e o raciocínio, reflectindo-se, de forma inequívoca, no desempenho e rendimento escolar.

A apresentação do livro terminou com a frase lapidar «O livro não é uma obra acabada; é para ser discutido».

Foi o que se fez a seguir, ao longo de mais de uma hora de debate com o público que encheu o Auditório Sousa Fernandes da Biblioteca. Começou por se falar da família e do facto de as exigências da vida profissional deixarem aos pais cada vez menos tempo livre para estes dispensarem aos jovens. Para inverter a tendência, Daniel Sampaio aconselha os pais a


«Tentar, de todas as formas, comunicar com os jovens. Não concordo que os pais tenham menos tempo. Na primeira metade do século XX, as crianças não tinham voz; os pais preocupavam-se em alimentá-las, vesti-las, preocupavam -se com a higiene, mas não tinham em linha de conta a sua opinião. Na segunda metade do século XX, generalizou-se a ideia de que as crianças deveriam ser ouvidas, surgindo um movimento intelectual que se debruçava sobre as questões do comportamento e da psicologia infantil. Os pais hoje dispõem de menos tempo físic, mas têm muito mais tempo mental para dispensar às crianças. Não tenho dúvidas de que, actualmente, os pais se preocupam muito mais com as crianças do que os pais da primeira metade do século XX, que só se preocupavam com trabalho. É necessário saber-se os antecedentes dos pais, as bases da própria família de origem, para caracterizar os pais de hoje. É é necessário pôr, também, os pais a falar uns com os outros para trocar impressões.»

Em relação à forma de seduzir os jovens para a leitura e a escrita, o clínico não tem dúvidas de que:

«Tem de se começar muito cedo. Dever-se-á começar a falar de livros quando se pega no bébé ao colo, isto é, com o bébé num braço e o livro na outra mão (risos). Tem de haver, também, tradição oral na família – o hábito de se contar histórias. Mais tarde, já na adolescência, é aconselhável falar ao jovem em livros que tenham a ver com o seu quotidiano. Deve-se aproveitar o facto de os adolescentes lerem outras coisas que não literatura. O que importa é que leiam. E é fundamental lerem na sala de aula, em voz alta. É sempre interessante convidar, escritores para falarem dos seus livros na escola. Os jovens de hoje não lêem menos, lêem de maneira diferente. E são capazes de fazerem coisas diferentes em simultâneo. Além disso, desenvolveram, com as novas tecnologias, outras capacidades. Desenvolveram, por exemplo, uma maior acuidade visual e auditiva. Depois, a disciplina também é importante. Os adolescentes adoram regras. Dizem que não, mas é para testar os adultos. Para tal, tem de haver flexibilidade mas também firmeza. Porque há tempo para tudo: para estudar, conviver, ler, dormir...»

A forma de promover factores de resiliência foi, também, um dos temas que preocuparam os pais e os professores que se encontravam na audiência:

«É necessário pesquisar as áreas em que os sujeitos tenham sucesso. Por exemplo, nos casos em que a criança ou o jovem manifeste dificuldades de concentração ou indisciplina, tem de se perceber em que é que cada um é competente: os alunos reagem de forma diferente, consoante a disciplina e a relação que têm com o professor.»

Abordado na questão da problemática de ser-se pai cada vez mais tarde, Daniel Sampaio é da opinião que: «deve-se ser pai em idade relativamente jovem de forma a que, quando os filhos cheguem à idade adolescente, os pais tenham energia e a firmeza necessárias para lidarem com comportamentos difíceis. Por outro lado, tem de se promover a cultura da infância. Os pais terão de dispor de tempo para os filhos.»

Para Daniel Sampaio, o trabalho de educar os jovens tem de ser desenvolvido em rede. No entanto, discorda da ideia de que os jovens tenham, hoje em dia, menos valores:
«Mas precisam muito de serem enquadrados, quer por pais, quer por professores. Estamos num mundo novo. Numa realidade diferente. Há que aproveitar as oportunidades.»

Cláudia de Sousa Dias
Lido aqui:
http://rendez-vous-arabie.blogspot.com/

terça-feira, 9 de março de 2010

António Lobo Antunes

Grande Entrevista

http://ww1.rtp.pt/blogs/programas/grande_entrevista/?k=Grande-Entrevista-com-Antonio-Lobo-Antunes.rtp&post=4111

MOMENTOS

Há Momentos

Há momentos na vida em que sentimos tanto
a falta de alguém que o que mais queremos
é tirar esta pessoa de nossos sonhos
e abraçá-la.

Sonhe com aquilo que você quiser.
Seja o que você quer ser,
porque você possui apenas uma vida
e nela só se tem uma chance
de fazer aquilo que se quer.

Tenha felicidade bastante para fazê-la doce.
Dificuldades para fazê-la forte.
Tristeza para fazê-la humana.
E esperança suficiente para fazê-la feliz.

As pessoas mais felizes
não têm as melhores coisas.
Elas sabem fazer o melhor
das oportunidades que aparecem
em seus caminhos.

A felicidade aparece para aqueles que choram.
Para aqueles que se machucam.
Para aqueles que buscam e tentam sempre.
E para aqueles que reconhecem
a importância das pessoas que passam por suas vidas.

O futuro mais brilhante
é baseado num passado intensamente vivido.
Você só terá sucesso na vida
quando perdoar os erros
e as decepções do passado.

A vida é curta, mas as emoções que podemos deixar
duram uma eternidade.
A vida não é de se brincar
porque um belo dia se morre.

Clarice Lispector

Bruno Aleixo

Bruno Aleixo no Pessoal e Transmissivel [Parte 1]

http://www.youtube.com/watch#!v=DOzeeuL4kQc&feature=related

Bruno Aleixo no Pessoal e Transmissivel [Parte 2]
http://www.youtube.com/watch#!v=ddeGDhiqdiM&feature=related

Bruno Aleixo no Pessoal e Transmissivel [Parte 3]
http://www.youtube.com/watch#!v=sEIJwb2lFEs&feature=related

não sei o que são "feidibers", mas sou levado a discordar!

-a opinião que tenho sobre o presidente da república é que é o cavaco silva. chega-lhe?

-quero dizer o que acabei de dizer!

...

mas o bruno ouve falar, de certeza, de políticos, com frequência..
- defina "com frequência."
- muitas vezes.
- defina "muitas vezes". qê, 3 vezes p/ semana?
- pode ser, sim.
- então não, não ouço falar de políticos com frequência.

HOME

Home - Edward Sharpe and The Magnetic Zeros


http://vids.myspace.com/index.cfm?fuseaction=vids.individual&videoid=100210003

segunda-feira, 8 de março de 2010

Animação

The Piano (Life is a song) corto animado/Short film Animated
http://www.youtube.com/watch?v=Q61BrrIKoRw


O Piano
http://www.youtube.com/frasedodianet

domingo, 7 de março de 2010

FOTOGRAFIA

A Passagem do Tempo


http://www.youtube.com/watch?v=Th81NKBTr6w&feature=player_embedded

NIETZSCHE

Ninguém pode construir em teu lugar as pontes que precisarás passar, para atravessar o rio da vida – ninguém, exceto tu, só tu.
Existem, por certo, atalhos sem números, e pontes, e semideuses que se oferecerão para levar-te além do rio; mas isso te custaria a tua própria pessoa; tu te hipotecarias e te perderias.
Existe no mundo um único caminho por onde só tu podes passar.
Onde leva? Não perguntes, segue-o!

- Friedrich Wilhelm Nietzsche -

BORGES

Deus move o jogador e este move a peça.

Que Deus por trás de Deus o jogo começa?

jorge luís borges

sábado, 6 de março de 2010

Fernando Pessoa

Poema do amigo aprendiz


Quero ser o teu amigo. Nem demais e nem de menos.
Nem tão longe e nem tão perto.
Na medida mais precisa que eu puder.
Mas amar-te sem medida e ficar na tua vida,
Da maneira mais discreta que eu souber.
Sem tirar-te a liberdade, sem jamais te sufocar.
Sem forçar tua vontade.
Sem falar, quando for hora de calar.
E sem calar, quando for hora de falar.
Nem ausente, nem presente por demais.
Simplesmente, calmamente, ser-te paz.
É bonito ser amigo, mas confesso é tão difícil aprender!
E por isso eu te suplico paciência.
Vou encher este teu rosto de lembranças,

Fernando Pessoa

sexta-feira, 5 de março de 2010

Verdade? Ou meia verdade?

"A porta da verdade estava aberta,
mas só deixava passar
meia pessoa de cada vez.
Assim não era possível atingir toda a verdade,
porque a meia pessoa que entrava
só trazia o perfil de meia verdade.

E sua segunda metade
voltava igualmente com meio perfil.
E os meios perfis não coincidiam.
Arrebentaram a porta.
Derrubaram a porta.
Chegaram ao lugar luminoso
onde a verdade esplendia seus fogos.

Era dividida em metades
diferentes uma da outra.
Chegou-se a discutir qual a metade mais bela.
Nenhuma das duas era totalmente bela.
E carecia optar.
Cada um optou conforme seu capricho, sua ilusão, sua miopia."


C.Drummond de Andrade

ANTÓNIO LOBO ANTUNES

Sátira aos homens quando com gripe


Pachos na testa, terço na mão,
Uma botija, chá de limão,
Zaragatoas, vinho com mel,
Três aspirinas, creme na pele
Grito de medo, chamo a mulher.
Ai Lurdes que vou morrer.
Mede-me a febre,olha-me a goela,
Cala os miúdos, fecha a janela,
Não quero canja, nem a salada,
Ai Lurdes, Lurdes, não vales nada.
Se tu sonhasses como me sinto,
Já vejo a morte nunca te minto,
Já vejo o inferno, chamas, diabos,
Anjos estranhos, cornos e rabos,
Vejo demónios nas suas danças
Tigres sem listras, bodes sem tranças
Choros de coruja, risos de grilo
Ai Lurdes, Lurdes fica comigo
Não é o pingo de uma torneira,
Põe-me a Santinha à cabeceira,
Compõe-me a colcha,Fala ao prior,
Pousa o Jesus no cobertor.
Chama o Doutor, passa a chamada,
Ai Lurdes, Lurdes nem dás por nada.
Faz-me tisana e pão de ló,
Não te levantes que fico só,
Aqui sozinho a apodrecer,
Ai Lurdes, Lurdes que vou morrer.


António Lobo Antunes

quinta-feira, 4 de março de 2010

Madame Tutli-Putli

Madame Tutli-Putli


http://www.youtube.com/watch?v=KcdzdHoDvkg

Auden

Na estação própria


Primavera, Verão, Outono: dias em que se adivinha
Um mundo prévio aos nossos conhecimentos, em que
As flores pensam na concretude do cheiro das cores
E animais de idade indefinida perseguem vidas irrisórias,
Horizontais, evitando serem, com esse nível de conduta,
Assessores da intriga do homem para se tornar divino.
Um metrónomo infalível instala-se em tudo: assim, em Maio
Crias de pássaros no ovo gritam às outras: Nasçam!;
Os cucos surpreendidos por Junho desafinam; quando Julho
Obeso liga o calor da terra, desembaraçando amarras venenosas,
As víboras entram na festa; avisadas pelo beliscão de Outubro
As folhas novas dão às velhas o puxão libertador.
Todavia, o Inverno tem o verbo certo de um olhar caseiro
Para nós mesmos, sentados cara a cara com os Nomes Próprios,
Tempo para ler os pensamentos, o tempo exacto
De experimentar novos metros e novas receitas,
De reflectir nos factos que meses mais quentes trouxeram
Até que, transmudados, façam parte de uma história humana.
Aí, respondendo à nossa exigência de compreensão,
A Natureza afrouxa o esgar até um arreganho mutável,
Pedras, sapatos velhos, renascem como signos sacrificiais,
Acenam-nos na Primeira Pessoa dos mistérios
Que desconhecem, acartando uma mensagem
Da única Fonte invisível do singular das coisas.

W. H. Auden (1907-1973)

quarta-feira, 3 de março de 2010

O BEM E O MAL

O Bem e o Mal


Quantas vezes, Senhor, este mundo parece
Um absurdo tremendo, aonde transparece
Um lívido clarão de trágica loucura...
O riso de Satã derrama a noite escura.
Sobre a algidez da terra amortecida e calma
Paira, como uma névoa, um crepúsculo d’alma...
Convulsões d’agonia abrem vales profundos...
E o nosso mundo chora a grande dor dos mundos!
Vê-se, por toda a parte, um morticínio horrível
D’almas que sofrem no Silêncio e no Invisível!...
Catástrofes sem fim, horrores, crueldades...
O ar que nos dá vida é o pai das tempestades!
A água que mata a sede aos ermos viandantes
Sepulta, no seu seio, as ilhas verdejantes
E os navios que vão, sobre as ondas, ao vento...
O fogo que prepara a hóstia do alimento,
O sacro fogo a arder sobre um bendito lar,
É o fogo que queimou teu corpo, Joana d’Arc!...
E o ferro que percorre, ó dor, as nossas veias
É o ferro que segura as portas das cadeias
E o que prende, ainda hoje, o grande Prometeu
A um monte, sob o riso irónico do céu!...
O mundo, ao mesmo tempo, a ser o bem e o mal!
A Natureza louca e Deus irracional!
O mal e o bem estão numa contínua guerra.
Como a atmosfera, a dor envolve toda a terra!...
Os feros animais devoram cordeirinhos...
O vento, a gargalhar, destrói milhar’s de ninhos!
Um dilúvio de fogo arrasa uma cidade
E uma vil ambição provoca a mortandade!
O luto veste a terra e a luz do sol exangue
Tem, de beijar o mundo, os lábios com sangue...
Qual é o teu destino, ó erma Natureza?
Riso louco a doirar o rosto da tristeza...
Qual o teu fim e o teu princípio, ó Criação!
É o sofrimento, a dor, a morte e a escuridão?
É, por acaso, o Mal a essência do Universo?
Satã, em cada ser, existirá, disperso?...
Mas como é que se explica a vida de Jesus,
E este voo imortal das almas para a Luz?
Sócrates por que viu na morte uma outra vida?
Quem lhe falou do Álem? Que voz desconhecida?...
Por que é que o grande Buda um trono abandonou
E um ceptro d’oiro, com desprezo, arremessou
Para longe, partindo humilde, pobre e triste
A pregar a Verdade a tudo quanto existe?...
Inconscientes serão ou loucos desvairados
Os grandes Cristos, a sonhar, crucificados?...
Maria, a tua dor é filha dum delírio?
Donde vem o prazer amargo do martírio?...
Donde nasce esta força oculta, misteriosa,
Esta crença, esta fé profunda e religiosa
Que nos leva prà morte a sorrir e a cantar?...
Donde dimana a Graça, assim como o luar
Que dá um aspecto d’alma às formas materiais
E uma expressão de génio aos brutos animais?...
Justiça, és ilusão? Amor, és falsidade?
Jesus, és a mentira? Ó Nero, és a verdade?...
Representais acaso o mesmo sentimento
Perante o azul e o mar, as estrelas e o vento?
A vida universal não vos distinguirá?
Na mesma indiferença, a terra guardará
As vossas cinzas? E as famélicas raízes,
Num frouxo de luxúria, esplêndidas, felizes.
Esses dois corpos definhados devoraram
E entre eles nem sequer, um momento, hesitaram?
Ó trágico mistério! Ó grande noite escura!
Duma voz que blasfema e duma voz que é pura,
Do sermão da montanha e das canções de Nero,
Das palavras d’amor, dum ai de desespero,
Do soluço de dor que sufocou Maria,
Dum brilhante sorriso egoísta de alegria,
De tenebrosa voz que esmaga e que condena,
Dessa voz de perdão que aureolou Madalena,
Do murmúrio do mundo, imenso e assustador
Chegará simplesmente um pálido clamor,
Uma mesma harmonia indistinta e apagada
À alma da Criação, remota e ilimitada,
Formando assim, ao longe, um murmúrio igual
A prece da Piedade e a blasfémia do Mal?...
Talvez para a harmonia ignota deste mundo
Concorram igualmente a noite e a luz do dia...
A fome e o desespero, o Bem e o vício imundo,
A mentira e a verdade, a tristeza e a alegria!...
Lágrimas de prazer e lágrimas de dor,
Porventura, sereis a mesma névoa densa,
Sob os raios do mesmo ardente e eterno amor
Que entre elas não se encontra a menor diferença?...
Será a parte imperfeita e o todo é a Perfeição?
O Universo é um composto estranho de escarcéus,
De trevas infernais que, combinadas, dão
O fulgor do infinito e o resplendor de Deus?
Ou é este Universo uma noite d’horror
Que já segura ao colo a aurora dum amor?
É um inverno que vai mudar-se em Primavera?
Há-de ser realidade o que hoje é uma quimera?
O sonho, a aspiração e as lúcidas visões
Que deslumbram o olhar vago das multidões,
Sempre que ouvem pregar, num gesto extraordinário,
Os que vão pela estrada amarga do Calvário,
Serão o alvorecer da nova Humanidade.
A aurora excepcional do dia da Verdade?
E a blasfémia do mal contra o amor e a vida,
É qual grito da noite, ao ver-se surpreendida
Pela eterna manhã anunciadora e estranha,
Que, súbito, aparece além duma montanha?...
Estrelas, revelai-me o fim da Criação...
Que a vossa luz separe o real da ilusão.
Entre as tristes canções da treva e da mentira,
Mostrai-me o canto ideal da verdadeira Lira!
Que a sempiterna luz se faça dentro em mim.
Que eu viva no Absoluto e no que não tem fim!
Que o fantasma d’amor, que anda sempre ao meu lado,
Se transforme num ser perfeito e imaculado.
Que deixe de ser sombra e se converta em luz...
Que seja árvore em flor e não sombria cruz!...
Que o nevoeiro espesso e triste do mistério,
Se dissipe e nos deixe ver o sol etéreo
Da Verdade e do Amor raiar por sobre o mundo,
Doirando tudo, desde o sapo mais imundo
À alma mais perfeita e ao mais duro rochedo,
De maneira que o pó, o lodo, o arvoredo,
A criatura humana e as feras mais selvagens,
O vasto mar antigo e as sensíveis paisagens,
Estremeçam d’amor e vibrem de alegria
E sejam a suprema e eterna melodia!...


Teixeira de Pascoaes

O caminho da manhã

Vais pelo caminho que é de terra amarela e quase sem nenhuma sombra. As cigarras cantarão o silêncio de bronze. À tua direita irá primeiro um muro caiado que desenha a curva da estrada. Depois encontrarás figueiras transparentes e enroladas; mas os seus ramos não dão nenhuma sombra. E assim irás sempre em frente com a pesada mão do Sol pousada nos teus ombros, mas conduzida por uma luz levíssima e fresca. Até chegares às muralhas antigas da cidade que estão em ruínas. Passa debaixo da porta e vai pelas pequenas ruas estreitas, direitas e brancas, até encontrares em frente ao mar uma grande praça quadrada e clara que tem no centro uma estátua. Aí deves parar e olhar um instante para o largo pois ali o visível se vê até ao fim. E olha bem o branco, o puro branco, o branco de cal onde a luz cai a direito. Também ali entre a cidade e a água não encontrarás nenhuma sombra; abriga-te por isso no sopro corrido e fresco do mar. Entra no mercado e vira à tua direita e ao terceiro homem que encontrares em frente da terceira banca de pedra compra peixes. Os peixes são azuis e brilhantes e escuros como malhas pretas. E o homem há-de pedir-te que vejas como as suas guelras são encarnadas e que vejas bem como o seu azul é profundo e como eles cheiram realmente, realmente a mar. Depois verás peixes pretos e vermelhos e cor-de-rosa e cor de prata. E verás os polvos cor de pedra e as conchas, os búzios e as espadas do mar. E a luz se tornará líquida e o próprio ar salgado e um caranguejo irá correndo sobre uma mesa de pedra. À tua direita então verás uma escada: sobe depressa mas sem tocar no velho cego que desce devagar. E ao cimo da escada está uma mulher de meia-idade com rugas finas e leves na cara. E tem ao pescoço uma medalha de ouro com o retrato do filho que morreu. Pede-lhe que te dê um ramo de louro, um ramo de orégãos, um ramo de salsa e um ramo de hortelã. Mais adiante compra figos pretos; mas os figos não são pretos mas azuis e dentro são cor-de-rosa e de todos eles corre uma lágrima de mel. Depois vai de vendedor em vendedor e enche os teus cestos de frutos, hortaliças, ervas, orvalhos e limões. Depois desce a escada, sai do mercado e caminha para o centro da cidade. Agora aí verás que ao longo das paredes nasceu uma serpente de sombra azul, estreita e comprida. Caminha rente às casas. Num dos teus ombros pousará a mão da sombra, no outro a mão do Sol. Caminha até encontrares uma igreja alta e quadrada.
Lá dentro ficarás ajoelhada na penumbra olhando o branco das paredes e o brilho azul dos azulejos. Aí escutarás o silêncio. Aí se levantará como um canto o teu amor pelas coisas visíveis que é a tua oração em frente do grande Deus invisível.

Sophia de Mello Breyner (1919-2004)

terça-feira, 2 de março de 2010

Pablo Neruda

Hoje o dia sabe-me a vida!


"Morre lentamente quem não viaja,
Quem não lê,
Quem não ouve música,
Quem destrói o seu amor-próprio,
Quem não se deixa ajudar.

Morre lentamente quem se transforma escravo do hábito,
Repetindo todos os dias o mesmo trajecto,
Quem não muda as marcas do supermercado,
não arrisca vestir uma cor nova,
não conversa com quem não conhece.

Morre lentamente quem evita uma paixão,
Quem prefere O "preto no branco"
E os "pontos nos is" a um turbilhão de emoções indomáveis,
Justamente as que resgatam brilhos nos olhos,
Sorrisos e soluços, coração aos tropeços, sentimentos.

Morre lentamente quem não vira a mesa quando está infeliz no trabalho,
Quem não arrisca o certo pelo incerto atrás dum sonho,
Quem não se permite, Uma vez na vida,
fugir de conselhos sensatos.

Morre lentamente quem passa os dias queixando-se da má sorte
ou da Chuva incessante,
Desistindo de um projecto antes de iniciá-lo,
não perguntando sobre um assunto que desconhece
E não respondendo quando lhe indagam o que sabe.

Evitemos a morte em doses suaves,
Recordando sempre que estar vivo exige um esforço
muito maior que o Simples acto de respirar.
Estejamos vivos, então!"

Pablo Neruda

Os professores na era digital

"Pela primeira vez na história da educação ocidental ocorre um momento único pela sua singularidade e muito preocupante pelas transformações que irá imprimir no trabalho dos docentes e na organização das escolas: – existe hoje um poderosíssimo instrumento de aprendizagem e de acesso ao saber (o PC) que os alunos já dominam melhor que a maioria dos professores e que manipulam com mais destreza que a generalidade dos pais.

O computador pessoal e o telemóvel modificaram, rápida e radicalmente, os rituais de iniciação nos grupos de pares, a comunicação intra e intergrupal, os graus de socialização e de integração, já que criaram novos gestos, linguagens, códigos, símbolos, valores e um mundo infindável de engenhos periféricos.

Numa só geração desapareceram muitos dos artefactos que constituíam a memória e a referência do mundo dos adultos contemporâneos: - o vinil foi o primeiro; agora agonizam os CDs, as cassetes VHS e os DVDs de primeira geração; um aluno de 1º Ciclo não faz a mínima ideia do que era uma cassete áudio ou um rolo de fotografia a cores; um vídeo gravador é um aparelho obsoleto e o arquivo de dados em disquetes pertence a um passado quase pré-histórico; grande parte da informação disponível já não existe em suporte de papel…

Se tanto não bastasse, há nas escolas uma geração de professores e de educadores já nascidos na era digital, que trabalham lado a lado com outros docentes que, envergonhadamente, se sentem info-excluídos, pois pertencem a uma outra geração que amadureceu, pessoal e profissionalmente, antes da era da internet, dos motores de busca, das bases de dados digitais, do matraquilho das mensagens por SMS ou da presença orwelliana do Messenger e do Fecebook.

São professores e educadores que olham para as novas tecnologias da informação e da comunicação com a desconfiança dos traídos, pois sabem que é ali que está a fonte do mal que os há-de levar à desactualização precoce e, logo, ao mal-estar profissional que acompanha o desgaste, a indisfarçável angústia e o stress.

Por cada dia que passa na vida das nossas escolas, o fosso que separa estas diferentes gerações de alunos e de docentes é cada vez maior e cria um clima gerador de conflito, de clivagem, de insatisfação e de exclusão. Já em artigo anterior descrevemos este tipo de escola como sendo a “escola do gato e do rato”, já que a utilização acéfala dos computadores e da internet inundou as aulas de trabalhos do tipo “seleccionar tudo, copiar e colar” (copy/paste). Nestes casos a produção intelectual revelou-se muito escassa. Os alunos conformam-se em descobrir páginas Web que abordem um determinado tema que se lhes mandou investigar. Depois limitam-se a copiar, a editar e a imprimir os textos, sem descodificarem e problematizarem o seu conteúdo. Há docentes que dão aulas com dados retirados de sítios que não fornecem aos alunos e, por sua vez, há alunos que elaboram trabalhos com dados retirados de sites que omitem aos professores.

É nossa profunda convicção de que aquilo que aqui descrevemos implica um perigosíssimo ‘corte geracional’ que tem que ser rapidamente atenuado e corrigido, se queremos eliminar a iliteracia digital e ter as nossas escolas a fazer parte da sociedade do conhecimento. Porém, a introdução precipitada e inconsistente do Magalhães nas escolas acentuou drasticamente esse corte geracional, já que o governo decidiu ‘equipar’ primeiro os alunos com computadores pessoais, esquecendo-se de ‘equipar’previamente os professores com formação específica. Sabe-se que não houve qualquer preocupação com a formação atempada dos intervenientes e com a monitorização do processo.

Infelizmente, a educação padece sempre deste estigma: o calendário eleitoral da classe política funciona no curto prazo dos ciclos eleitorais de quatro anos, exigindo resultados rápidos, imediatos e mediáticos. Daí que o investimento em educação, sobretudo na formação dos seus actores, não lhe interesse, já que só permite medir os resultados a médio e a longo prazo, e muitas vezes em contra ciclo eleitoral…

Por tudo isso, os professores devem exigir imediata formação nas tecnologias da informação e da comunicação ou correm o perigo de se tornarem info-excluídos e profissionalmente desajeitados. Urge diminuir esse fosso digital, porquanto não há escola do futuro que consiga sobreviver sem incorporar essas novas tecnologias. Até porque a generalização cega das TIC, sem sentido e contexto pedagógico, pode provocar uma deriva na utilização destes instrumentos do saber, com desperdício do investimento realizado e com perigosas consequências para os aprendentes.

Hoje, não basta que o aluno só aprenda a ler e escrever textos na linguagem verbal. É necessário que ele aprenda a ‘ler’ e a ‘escrever’ noutros meios, como o são a rádio, a televisão, os programas de multimédia, os programas de computador, as páginas da Internet… Só assim conseguiremos erguer uma escola pública que seja exigente na valorização do conhecimento e promotora da autonomia pessoal. Uma escola pública que não desista de uma forte cultura de motivação e de realização de todos os membros da comunidade escolar. Uma escola pública que assuma os seus alunos como primeiro compromisso e os professores como seu principal valor. E que, em fim, se revele como um espaço de aprendizagem promotor do debate e da reflexão crítica, incentivando-se a participação cívica nesta aldeia global que é o mundo de hoje."
João Ruivo



extraído de http://www.ensino.eu/home.html

Revista mensal – nº 144 - Fevereiro de 2010

segunda-feira, 1 de março de 2010

Zilda Cardoso

"Procuro entender as actuais tendências da comunicação social a respeito de política e afins, para além da experiência. Como na moda, é necessário, antes de qualquer coisa que nos ocorra, conhecer as tendências. A Internet será o sítio ideal para a investigação.

Há muitas definições para política, muito conceituadas desde Aristótoles. Escolho duas: “estudo das relações de regularidade e concordância dos factos com os motivos que inspiram as lutas em torno do poder do Estado e entre os Estados"e “ciência moral normativa do governo da sociedade civil”.

Ciência moral normativa do governo…

E para comunicação social escolho as mais modernas - "o estudo das causas, funcionamento e consequências da relação entre a sociedade e os meios de comunicação de massa…” “ Engloba os processos de informar, persuadir e entreter as pessoas. Encontra-se presente em praticamente todos os aspectos do mundo contemporâneo, evoluindo aceleradamente, regista e divulga a história e influencia a nossa rotina diária, as relações pessoais e de trabalho.

Informa, divulga, evolui rapidamente…

Porém, o que nos cabe no presente como comunicação social a respeito de política terá alguma coisa a ver com estas ideias?

Informa, esclarece... ou confunde? A forma como é feita, desfeita e refeita… a informação… os temas que aborda, apoquenta-nos verdadeiramente, porque domina a nossa rotina e impressiona as relações de modo obscuro e negativo.

A informação política já não persuade nem entretém senão uns tantos. A maioria não tem vontade de ler (porque não vai acreditar) nem de ouvir nem de ver noticiários, análises sábias, discussões em vozes que se sobrepõem sem fim, se misturam, whatsoever, wherever, whosoever, whenever…

A intensidade da nossa vida colectiva é toda feita de intrigas, denúncias, combinações e estranhos negócios, maledicências labirínticas, queixumes e conluios. Ninguém afirma seja o que for que não vá ser desdito falaciosamente argumentado. Tudo parece ter entrado em turbilhão no caldeirão do João Ratão, onde vai ser aquecido, remexido, moído, temperado a gosto e finalmente passado (num sentido forte do termo ou, talvez melhor, em todos os sentidos).

Sempre ouvi que nós, portugueses, necessitávamos de usar mais a imaginação, de usá-la de forma racional. Eu acreditei nisso e recomendei.

Mas não temos falta de imaginação. A propósito de quê ou a favor de que usaríamos mais a imaginação? Temos imaginação a mais – vivíssima, terrível, diabólica. O nosso mundo parece disforme ou está em pedaços, por excesso dessa imaginação.

Quando será passado… tudo isto que agora vivemos? (Não me refiro a nenhuma crise económica.) Teremos que nos libertar de máscaras e passar a ver e a ser vistos com claridade e simplicidade."

Recordo alguma poesia de Sophia e evoco estes seus versos:

“Esta foi sua empresa: reencontrar o limpo

Do dia primordial. Reencontrar a inteireza

Reencontrar o acordo livre e justo

E recomeçar cada coisa a partir do princípio”.

lido no blogue de Zilda Cardoso

http://zildacardoso.blogs.sapo.pt/