É novo: Mário Crespo defende-se antes de ser atacado. Tem o tom crespo que corresponde às qualidades do tecido de lã, crespo e leve, a que os franceses chamam crépon e nós, seguidistas, crespão. A crespidão é a qualidade do que é áspero. Mas não é o estilo de Crespo, que é aveludado sem ter a coragem de ser suave e untuoso sem se reconhecer como gorduroso.
José Sócrates é muito intolerante — mas tem esse direito, como todos temos. Porque há-de medir as palavras e as acções, como se fosse melhor do que nós? Acho muito bem que se indigne e ponha processos como o comum dos mortais. Deverá alguém — à parte os indiferentes da Prisa — prescindir da liberdade de dizer o que quer? Parece-me que, num pensamento totalitário, se confunde o político com o legal. Sócrates, antes e depois de ser primeiro-ministro, é um cidadão como qualquer um de nós. E faz bem — é libertador — agir como tal, mesmo quando se comporta como a prima donna que, de facto, por feitio dele e eleição nossa, é. Sócrates, ao reagir como cidadão e abster-se das condescendências e pseudo-aristocracias da democracia, presta um serviço e rompe com uma tradição. Não é um Presidente da República, acima de tudo: é um eleito que elegemos para mandar em nós. Pode ser um chefe temporário mas faz bem em ser um cidadão e indivíduo para sempre. Crespo é mais aromático e mais permanente. Fazer-se de vítima antes de ser — só porque há muito que há muitos que não gostam dele — é, a bem dizer, desumano.'
Miguel Esteves Cardoso, O tom crespo (Público)
segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010
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